O BNDES É UM ROBIN HOOD ÀS AVESSAS? POR ANDERSON SILVA
Por Anderson Silva*
Neste artigo abordaremos como no período de 2003 a 2016 por intermédio do BNDES ocorreu a maior transferência de renda dos contribuintes para os setores empresariais mais alinhados aos governos de ocasião em toda a história econômica nacional. Também abordaremos por que tais transferências vultosas de recursos públicos subsidiados foram as principais razões que conduziram o Brasil a sua maior crise econômica em mais de um século.
Certamente os leitores já devem ter escutado muitos comentários por meio da imprensa sobre os polêmicos financiamentos subsidiados (quando as taxas de juros praticadas são inferiores a média das taxas praticadas pelo mercado financeiro) realizados pelo BNDES nos últimos anos.
Inclusive, a relação entre o expressivo volume de empréstimos fornecidos pelo BNDES e a gravíssima crise econômico-fiscal que assola o país decorre do fato de que no período de 2003-2016 foi liberado o estrondoso volume de R$ 2,57 Trilhões de reais - valor quase 8 vezes superior aos recursos liberados para o Programa Bolsa Família no mesmo período, conforme podemos depreender por meio da observação do quadro abaixo produzido pela Fundação Indigo de Políticas Públicas:
Cumpre salientar que o BNDES é financiado pelo Tesouro Nacional, ou seja, quem lhe financia, na realidade, são os pagadores de impostos, pois a taxa média de juros cobrada pelos grandes empréstimos liberados por este banco de fomento (no período 2003-2016) foi de 7% a.a. ao passo que para obter recursos para realizar os empréstimos o governo federal teve que emitir títulos da dívida pública no mercado com taxa média de juros da ordem de 13% a.a - veja, há uma diferença, desta forma, de 6% a.a., isso corresponde aos subsídios oferecidos aos empresários politicamente mais próximos dos governos petistas e tais subsídios foram custeados pela população.
No entanto, a população em contrapartida recebeu benefícios muito aquém dos desejados face aos volumosos desembolsos de recursos públicos subsidiados vez que o crescimento econômico acumulado no período de 2003-2016 foi de 32,5% (segundo dados do IBGE) o que correspondeu a média de crescimento de 2,32% ao ano e convenhamos este patamar de crescimento esteve longe de ter sido um “espetáculo do crescimento” como as autoridades públicas gostavam de alardear publicamente naquela época.
Além disso um outro argumento sempre utilizado pelos defensores destas políticas de fomento por meio de recursos públicos subsidiados é a questão do incremento da geração de empregos, porém mesmo diante de somas estratosféricas de desembolsos o Brasil terminou o ano de 2016 apresentando uma taxa média de desocupação da ordem de 11,5% (segundo dados do IBGE) o que correspondeu a 12,3 milhões de pessoas desocupadas. Portanto diante desta desalentadora realidade demonstrada pelas estatísticas oficiais é muito difícil atribuir sucesso no tocante a geração de empregos às políticas de fomento realizadas por instituições como o: BNDES.
Ademais, tais empréstimos “camaradas” do BNDES não foram oferecidos apenas para grupos empresariais nacionais como: o Grupo X do empresário Eike Batista que recebeu R$ 10,4 Bilhões e a holding J&F (dona da marca JBS) do empresário Joesley Batista que recebeu R$ 8,1 Bilhões, também foram concedidos vultosos financiamentos para obras situadas em outros países sendo que a maioria destas obras foram executadas pela Construtora Odebrecht..
De acordo com Auditorias realizadas pelo TCU (Tribunal de Contas da União) foi constatado no período de 2006 a 2014 o desembolso de R$ 50,5 Bilhões para a realização de 140 grandes obras em países como: Cuba que recebeu R$ 3 Bilhões para a construção do Porto de Mariel, para a Venezuela que recebeu R$ 11 Bilhões sendo que parte de tal valor foi utilizada para a construção do Metrô de Caracas, Angola que recebeu R$ 14 Bilhões, Argentina que recebeu R$ 8 Bilhões, República Dominicana que recebeu o mesmo montante de R$ 8 Bilhões e para obras situadas em Moçambique e no Equador.
O curioso é que no período compreendido entre os anos de 2003 a 2016 em que governos petistas (os quais se autodeclaravam populares) estiveram no poder foi coincidentemente o período histórico em que houve a maior transferência de recursos das camadas mais vulneráveis da população para as elites econômicas mais próximas à cúpula destes governos, vez que tais recursos públicos são arrecadados principalmente das camadas mais necessitadas da população devido ao fato da carga tributária brasileira ser extremamente regressiva (pois incide com mais intensidade sobre o consumo). Também vale destacar que parcela significativa dos recursos emprestados pelo BNDES é oriunda do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e desta forma, sem perceberem, os empregados financiaram os empresários politicamente mais influentes do país por intermédio de empréstimos realizados com recursos públicos subsidiados.
Não obstante as estatísticas negativas no que concerne aos efeitos orçamentários decorrentes do imenso dispêndio de recursos públicos, ao direcionamento muitas vezes de cunho político em relação a muitos destes empréstimos e ao baixo retorno social proporcionado por estas políticas de estímulo à atividade econômica por meio destes empréstimos subsidiados, eis que em surgiu uma boa notícia decorrente da sanção da Lei 13.483/2017, que trata da criação da TLP - Taxa de Longo Prazo a qual irá substituir a TJLP - Taxa de Juros de Longo prazo (atualmente utilizada como referência para os empréstimos concedidos pelo BNDES) a partir de 1º de Janeiro de 2018.
As vantagens, sob a perspectiva do orçamento público, da TLP em relação à TJLP inicialmente reside na questão da transparência vez os subsídios do crédito passarão a constar no orçamento, ademais esta nova taxa também possibilitará a diminuição do custo do crédito para todas a pessoas e não apenas para os devedores do BNDES.
A título de curiosidade, em 2016 o custo com subsídios foi da ordem de R$ 29 bilhões e este ano deverá chegar a R$ 15 bilhões segundo dados do Tesouro Nacional.
Com efeito, a mudança da TJLP para a TLP contribuirá para aumentar a eficiência da política monetária no controle da inflação uma vez que se um grupo de privilegiados possuem acesso facilitado aos recursos com juros abaixo do patamar estabelecido para a taxa Selic passa a ser necessário que a autoridade monetária estabeleça a taxa oficial de juros num nível mais elevado para o restante da economia a fim de “compensar” os efeitos da ausência de “aperto monetário” sobre o grupo de privilegiados. Desta forma se houver menos subsídios para determinados grupos privilegiados, a taxa de juros oficial da economia, a SELIC, poderá ser menor para todos indistintamente o que poderá proporcionar no médio prazo um modelo de crescimento econômico mais sustentável e socialmente mais justo.
Finalmente, para que futuramente a sociedade brasileira não seja novamente vítima de crises econômicas como a atual ocasionada especialmente pelo endividamento excessivo do Estado (que decorreu principalmente do direcionamento político das transferências de recursos públicos) e que gerou grave recessão econômica e desemprego de milhões de trabalhadores brasileiros é fundamental a população brasileira aprender definitivamente que a utilização de recursos públicos sob orientação política para favorecer grupos econômicos aliados só faz perdurar as relações espúrias entre empresários e governantes desse modo acentuando nosso renitente capitalismo de compadrio, o qual infelizmente sempre resulta em gigantescos prejuízos aos cofres públicos a serem pagos pela população na forma de aumento da carga tributária e de desemprego.
Mas felizmente há uma luz no fim do túnel vez que este “Capitalismo de Compadres” financiado por recursos públicos subsidiados tem sido desnudado de modo eloquente pela Operação Lava Jato.
*Anderson Silva é Economista formado pelo Mackenzie CORECON 33.601 e atualmente exerce cargo efetivo de Controlador Interno na Câmara Municipal de Diadema.